Assim que o
salto fino cravou no chão, saiu do carro sentindo uma corrente de uma típica
brisa londrina passar por seu corpo. Agarrou-se ao sobretudo com mais força e
trancou o carro. Ergueu os olhos para o velho prédio que estava as ruínas,
sorrindo automaticamente ao lembrar de quando sua vida era perfeita ali e não
sabia. Com um suspiro, deu vários passos até chegar aos três degraus
principais.
As paredes
desbotadas de tinta, o corrimão enferrujado e o mesmo cheiro de café ainda
predominavam nos corredores e se pegou sentindo saudades de todas as vezes que
subiu e desceu aquelas escadas, ouvindo os vizinhos brigando e cachorros
latindo.
Caçou o molho
de chaves dentro do bolso do casaco e assim que a maçaneta girou, sentiu o
peito despencando. O apartamento estava vazio. Isso era óbvio. E já esperava
que estivesse. Ficaria mais surpresa se encontrasse ele habitável do que
qualquer outra coisa.
Fechou a
porta atrás de si e permitiu caminhar até a sacada que tinha uma das vistas
mais brilhantes. À direita, dava para ver certinho a London Eye que tanto fez
sua felicidade nos dias em que se sentia só. Agora isso já fazia parte da sua
rotina. Digo, sentir-se só.
Deu mais uma
olhada em tudo e logo sentiu um suspiro sufocar-lhe a garganta. Caminhou pelo
apartamento que sempre fora bem iluminado enquanto ouvia a madeira no solo
ranger.
Riu sozinha.
Lembrou-se do
dia de seu aniversario e que ele tentou-lhe fazer uma surpresa pela manhã, mas
o barulho do assoalho era tanto, que ela acabou acordando e estragando a surpresa.
O riso se
perdeu entre as paredes.
Sentiu o
coração apertar quando deparou-se com a porta de vime em que haviam pintado
juntos. Empurrou com o joelho e encostou-se nela, passando os olhos lentamente
pelo quarto.
Reviveu cada
móvel localizado em cada lugar e pode jurar que viu suas meias prediletas
perdidas embaixo da cômoda dos livros enquanto a toalha molhada dele estava
jogada em cima da cama. Analisou em sua mente a cadeira perto do armário cheia
de roupas em cima e o cantinho da cama que tanto arrancou-lhe a pele de seu
mindinho. Permitiu-se sorrir por um instante enquanto fechava os olhos.
Respirou
fundo e jurou sentir o perfume dele misturado com loção pós barba. Barba que
ele insistia em dizer que tinha por sinal, mas jurou nunca ter visto nenhum
pelo em seu rosto. Ouviu ao longe um xingamento, típico de quando ele derrubava
alguma panela quando tentava se aventurar na cozinha.
Sentiu os
olhos umedecerem apesar de estar fechados. Trincou os dentes, odiando-se por um
segundo. Abriu os olhos e voltou à realidade. Havia acabado. Tudo na vida tem
um final, não é?
Sentiu a
raiva subindo e ignorou todos os pensamentos fúteis que ainda a prendiam ai e
deu meia volta, retornando a sala vazia. Mas qual era o seu problema? Porque
simplesmente não podia aceitar que agora sua vida era sozinha e que ele havia
achado alguém que o fazia feliz?
Sempre teve
certa relutância com términos, mas esse tinha sido o mais doloroso. Talvez por
todas as lembranças. Pela felicidade proporcionada. Pelas risadas. Pelas brigas.
Pelo apartamento que dividiram. Pelo mundo que construíram juntos.
Olhou para os
lados e percebeu que finalmente estava perto da saída, mas seu coração deu mais
um salto quando jurou ver perto da janela, nada mais do que .. letras.
Andou até o
local e reconheceu a caligrafia.
De tinta de
caneta preta contra a madeira branca do parapeito da janela da cozinha,
conseguiu ler: Eu sinto sua falta.
Suspirou e
tentou pensar que isso havia sido escrito por ela mesma enquanto ele viajava
com a banda e ela sentia-se sozinha no apartamento. Tentou criar uma cena dela
mesma escrevendo isso. Não queria admitir a verdade.
Não queria
admitir que ele havia escrito aquilo. E pior ainda: que era recente.
Sentia uma
falta imensurável de todo o passado, mas certas coisas terminam para que
melhores comecem. Não que ela havia encontrado algo ou alguém melhor depois do
termino, mas ele havia. E ela tinha de respeitar sua escolha. Mas como, se nem
ele mesmo respeitava?
Permitiu-se
chorar pela ultima vez ali, no lugar onde havia sido seu mundo por tantos anos.
Permitiu-se sentir o abraço frio de tantas lembranças, para que finalmente
quando erguesse o chão do piso frio da cozinha, enxugasse os olhos e não
voltasse mais para lá.
Por mais que
sua vontade fosse permanecer para sempre.
Em outra vida, eu seria sua garota nós manteríamos todas as nossas promessas, seríamos nós contra o mundo. Em outra vida, eu faria você ficar então eu não teria que dizer que você foi aquele que foi embora.
Autora: Brenda Vizzotto
Em outra vida, eu seria sua garota nós manteríamos todas as nossas promessas, seríamos nós contra o mundo. Em outra vida, eu faria você ficar então eu não teria que dizer que você foi aquele que foi embora.
Autora: Brenda Vizzotto
que texto lindo! :')
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